março 13, 2011

marginal

tristeza minha encara escarra em ladainha. olhe bem fundo dos meus olhos, que são por assim dizer, castanhos. mergulhar nisto que é quente e úmido, que é tristeza morna e elétrica, escorrendo fluida sem correr. minha tristeza morna escorrega, não aconhega, enche-se, lentamente, toma, eu, seu, mundo. de pouco a pouco nascerei transtornada. bobeira. pequenos transtornos que fazem mudar a íris de cor e tamanho. expandem-se, encolhem-se, colorem. os olhos que te dei já não os vejo. os meus já mudaram: nunca mais o mundo será aquele. e que mundo era? minha memória vaga, lenta, sem entender. tudo aqui dentro é tão lento e quente que mal percebo. cera quente, mel de abelha, de doce a amargo e duro. tudo aqui dentro é tão grande, mas sobram tantos espaços. paredes, mil delas, delimitando e dividindo, obstruindo e obstaculando. paredes e depois dela, cômodos vazios, corredores extensos de grandes cômodos vazios. abstinando e abstraindo. não há o que fazer: o vazio preenche a tudo e não há mais espaço. no hay banda. e nem por isso não quer dizer que no hay musica. há chiados. sussurros. só sei te falar assim, em sussurro. queria te falar de um jeito que minhas palavras escorresem pelo vazio de seus poros, entrasse pelo canal comprido e desobstruido de seu ouvido, que atingissem o vazio e o enchessem em cheio, por cheio. de um jeito que não fosse preciso falar. que me olhasse nos olhos, que são castanhos e só, e pudesse saber. saber de me acariciar, e que fosse eterno o consolar. e que não se importasse com o úmido dos meus olhos, minha imensa vontade de chorar. e a boca torta que faz quando chora-se demais, quando é bem lá no fundo. bem sabe que o choro é ácido se vem de dentro, entorta a alma e por isso quando torna aos olhos, entorta a cara. e a máscara mostra, sem simetria, torto o ventre, mundo elíptico, epiléptico. todo meu corpo quer se rebelar, toda minha vida quer dar para trás, quis te falar: a partir daqui, desisto, não posso mais. acho melhor me entregar. e o meu corpo, louco, convulso, a pular para as multidões: sofro, aqui, sofro, me sinto triste, sim, triste, tão só isso: triste. porém ao contrário de tudo tenho apenas olhos marejados e a voz baixa. ao contrário de tudo meu corpo não dá menor sinal, meu olho abaixa se investigado a fundo, meu coração expurga o mergulhar profundo. estou à margem. marginal: mas não como quem quer voltar, ou como quem se orgulha de ser: marginal, por não ter coragem ou só marginal: por estar à margem, flutuando, deixando-se, amarginando-se, de tanto amargar.