março 28, 2009

consequencias de uma queda sem paraquedas

Chuva em SP para trens,
deu na manchete e eu pensei
de são paulo para trens,
será trens uma cidade?
deu na telha e eu matutei
será esse aquele verbo
que o acento se ausentou?

E de Auto-Retrato, tão bonito
vi na TV aquilo distorcido:
não perca Autorretrato
no dia primeiro de abril.

E de tantas dissertações
parei, confusa, a esquecer ideias
para pensar em hífens e tremas
me esqueci de todo sentido
e parei, aborrecido.

que diabo de jiboia que entrou pela goela
dessa gente meio maldita
dá à eles meia tipoia para sustentar suas tripas
e parar de enfiar erro onde a cabeça já encuca
e que todo povo se indiferencia e diz,
sem retórica ou eloquencia
'que diabo de ortografia
que só insiste em nos foder
deixa que use guarda-chuva
que somos todos mesmo
sub o que quer que seja.'

março 27, 2009

sobre andar.

e perder as coisas pelo caminho.
perco-as aos montes.
sem saber, imaginar.
queria sempre poder voltar.
não sei como fazer para recuperar.
não sei como fazer para previnir.
eu perco e acho melhor chorar.
acho que a culpa é do mundo.
a culpa é minh'alma leviana.
mal sabe carregar o que se dá.
sobre não saber como andar.
e sempre perder o que se quer.

Why should I stay here?
Why should I stay?

março 22, 2009

março 15, 2009

esquina.

escondam em esquinas,
soltas, estas vísceras
abarrotam as calçadas,
se esparramam em nada.

dobram as esquinas,
andam sem destino,
param em desatino,
esboçam uma alma.

que há de querer
se é solitário ser?
que há de fazer
se não quer crer?

e que tanto se desfaz
quer a tudo sentir
quer de tudo a saudade
de um corpo em paz.

e há de ter memória
e revirar-se no escuro
perdida em labirintos
improvisa gritos mudos.

aqui se reduzirá
pois sempre olhará
a imagem que reflete
seu olhar que te impede.

acalma essa ventania
encha-se de fantasia
preenche alma pouca
querer aqui, uma esquina.

março 08, 2009

mujer.

que há de mal nas suas mãos calejadas e o tempo que lhe falta a cada suspiro? que há de mal que fuja de tantos choros para mamar e bocas para ninar para que possa, em paz, fumar seu cigarro? desde seus pés enfiados em saltos altos, em botinas, em rasteiras, em tênis furados, em chinelos sujos. há de ser limpo, passado, engomado. costura-se um pouco e ali as linhas da vida, vai se arremedando, dando jeito, puxa aqui, dá uma mordida. que há de mal se manchas a calcinha com aquele vermelho tão reconhecível? e deixas que sinta a dor que amaldiçoa seu gênero, e deixa que dêem muitos dias para que possas ser você e chorar por tudo e gritar em tudo e dizer olá, é só a tensão pré mentrual. precisam que entendam suas lágrimas escondidas, precisam que ouçam suas palavras aceleradas. e se falas tanto é porque tem medo da solidão. quer que te ouvem em todos os lugares, e se não há ouvidos, conversa com as flores. que há de mal se foges e descobres o mundo com os próprios pés e esqueces de fazer as unhas do pé? de unhas pintadas, o vermelho hostil que é só desabafo, o rosa claro que é só doçura. que há de mal se faz voz de criança, se grita ao ver pequerruchos e cachorrinhos? que há de mal se tens raiva de quem cresce dentro de ti, se queres abortar uma alma que corrói a sua? também matam os gatos, vocês. e que tens se gritam demais, o orgasmo nas línguas e na vagina merecem, todo o gozo e toda a vida que lhes é garantida. que mal há em esperar que lhe dão uma flor? enfia os papéis aqui e ali, tece os fios nas máquinas destrutivas, cozinham, chefeiam, apitam, dirigem, assaltam. também vocês, sabem como ameaçar, sabem como espalhar veneno, e aguentam todas as guerras. sabem escolher o perfume certo e dar o qualquer sorriso que enterneça o que mais é sólido. também vocês, querem que haja firmeza, querem que estejam em pé. e ver a alma fluída, livre, voar, voar entre prazeres diminutos, prazeres. de todos os cheiros de todos os gostos de todos os toques de todos os sons. que mal há de achar que são princesas e terão, no final, direito a um castelo? e que mães, que belas mãos, que tanto carinho há de ter dentro de ti para que abandonem a própria vida para dar tudo à outra. que há mais lindo do que tal barriga viva e saudável, não ganharás da modelo mais magra que te subestima! e beijam, os beiços cansados de tanto esticar-se e contrair-se, e olham, e gargalham. nas salas de café, nos banheiros das festas, nas ruas, sentadas na chuva, corroendo as unhas, escolhendo os brincos, penteando os cabelos, limpando o corpo na pouca água que pinga e pinga. que mal há se beberes? povoarão os botecos e serão companheiras errantes. que mal há se traírem, atropelarem a culpa, confusa de sentimentos, esquecidas em guarda-roupas? que mal há se levantares a voz no palanque, usares enloquencia que lhes és bem servida para transmutar e politizar? entopem-se de vícios escondidos, querem dar os nomes certas às coisas, tem nos pés música e dança, nas mãos arte, nas bocas poesias. sabem poetizar, por si só, sabem todas as filosofias sem ler nenhum pensador. que mal há de dizer que quererão outras mulheres? peles sem pêlos, peitos arrebitados, cabelos bem tratados. que mal há de querer para si um homem? que haja pinto e compreensão quando necessário, que haja a quem chamar quando a lâmpada apagar. um alguém para abraçar, uma chama para reacender, motivo para continuar. há de seres a revolução de gêneros. há de concluir a evolução da espécie. progenitoras, essências de vida, enfiadas em turnos múltiplos, esquecidas e chorosas em asilos. que há de mal se rezarem, se resta-lhes a fé, a oração cantada, pronunciar aquele nome em voz alta, agradecer e ajoelhar-se?
serão lágrimas sempre verdadeiras que transbordarão de seus olhos. serão vozes estridentes, de finas a grossas, vozes que consolam, que cantam a luz que os outros não podem ver. dirão entredentes, bem baixo, nos ouvidos de filhos, maridos, amigos, idiotas o que há de ser o que há porvir: ouves o coração.

há de ser: mulher, ouve teu coração e segue. mulher, que há de você um pouco de tudo, e tudo tem um pouco de você.

(de mim para mim e todas).

março 04, 2009

e na porta do céu.

e então o manto da Morte desceu sobre mim. tudo bem, contando que nos últimos tempos, eu só via deserto e deserto e aquela luz dourada e tremeluzante que me roubou o mundo.
contente de chegar aos reinos do céu, esperando por uma brisa reveladora, vi, de longe que não parecia São Pedro aquele cara na portaria. até porque São Pedro tem idade, digamos, um vovô rigoroso da ética e da moral, e lá de lá eu podia ver que o cara era um adolescente. talvez fosse mais novo que eu. foi quando cheguei bem pertinho, bem cauteloso (quem sabe não é o diabo tentando me enganar, ou uma provação do Senhor)... e AH! ENTENDI TUDO, SEU FILHODAPUTA.
o adolescente era enorme, tríceps do tamanho de ninbus, um peitoral definido, uma sunga cor azul anil que se confundia com o céu ao redor. um cabelo dourado e cacheado que lhe caía nos olhos, uns caracóis perfeitos e curtos. os olhos eram vermelhos, tão vermelhos quanto o sol, dava-me agonia de tentar olhá-los. e a pele dourada, parecia emitir tamanho calor de vulcão em erupção.
- chega aí, véio.
a voz era grossa, e só de abrir a boca, senti tal calor do mundo inteiro em um orifício só. tinha na mão uma garrafa co um líquido rosa fluorescente dentro, gotículas de água permeavam o vidro, aquilo era demais pra mim, eu e minha garganta sequinha sequinha.
- quem é o senhor? (assim de letra minúscula, se me permitem)
- sou Calor, brow.
- e é você que comanda tudo isso?
- sou eu, sim. maior parada legal.
- e cadê todos os Outros? (com letra maíuscula, peloamordedeus)
- se mandaram, véi.
- como assim, e a pobre da Terra?
- eles usaram um ditado de vocês, um tal de 'cada povo escolhe o governante que tem.'
ele me parecia meio estúpido, meio lento. fiquei esperando mais explicações, um pouco inconformado. mas contive minha revolta... afinal, eu era magro e sem vida. apenas um sopro de alma desqualificada.
- Zeus fez uma cena tal, com a ajuda daquele tal do Dionísio... enfiou um raio no peito dele, caralho! disse assim 'saio da vida, pra entrar na história'. ele tá mei doidão, sei lá, acho que usou drogas, hehehe, sabecomoé, o cara num é vivo num é morto, e ele que fez a História.
não sabia se ele zombava de mim. minha garganta d'alma sequinha sequinha, se tivesse água no espírito da gente, estaria todo derretido aos pés daquele senhorzinho maldito.
- você pode me dar um pouco disso?
- como se atreve? acho quê voce merece uma segunda vida. o planeta tá uma beleza com eu por aqui, várias mulheres de biquinis, coisa e tal e tal coisa, que tal voltar?
- ah não, prefiro a brisa daqui. me disseram que venta que é uma beleza, verdade?
- véio, isso num é você que escolhe, tá ligado?
e me empurrou com aquele dedo enorme, aquele dedo quente, parecia ponta de cigarro na pele da gente.
e enquanto caía gritei:
- quem é sua mãe, caralho?
- a mulher do diabo, véi! mulher de diabo fiel num é!