julho 31, 2009

re-trato 1: o velho safado.

não há maior prazer, nesta vida mesquinha que deus e diabo nos colocaram, do que sentar ao lado de uma moça bonita no ônibus. quanto mais moça, mais bonita. quanto mais decote, maior deleite. de leite, nunca quis saber. não me apego às mães, nem às senhoras. um dia me perguntaram uns amigos, uns dos poucos que ainda coleciono, se eu não tinha vergonha de gostar tanto das menininhas. que eu tinha mesmo é que gostar das viúvas, das velhas, das senhoras charmosas. e eu lhes disse, para que gostar de um tanto de rugas e pelancas sem cor? e eles, assombrados, me compraram um espelho, por achar que faltava em casa, e me disseram, sem medo nem afeição, também é velho, e não tem dentes, também tem rugas e é muito feio. o que você tem de bonito, seu antônio, é a sua experiência. e também as senhoras as tem. experiência de cu é rola. a experiência que levei desta vida foi de perseguir meus prazeres. pois as dores vem e vão, sem que a gente chame ou reclame, e não há nada o que fazer contra elas. mas há de se sentir vivo, e de se sentir carne, quando o sorriso sorri o gozo intenso. e passado de mulher velha, não me importa. passado é coisa velha e sem valor, poderíamos amassar todas essas páginas, fragmentos trágicos que só nos deixam saudosos do que não volta jamais. essas velhas são monumentos de saudade, e saudade amarga a vida. essas velhas não tem dentes, tem peitos caídos como o quê, tem a boceta cheia de teias de aranha, e ainda tendem a ser moçoilas, fingindo inocência. todas as velhas são virgens. e - perdoe-me, senhor, por dizer tais imoralidades - nunca me apeguei às virgens. gosto do sexperienced, gosto de casais jovens em praças públicas, que se lambem em contínuo desassossego. sento, coloco o jornal no colo, que é pra não me importunarem por algum volume que surgir. se volume surgir, darei graças à deus. é o que eu digo, se me reeprimem na rua, sou velho inofensivo. tudo que quero é ver. nada mais posso fazer. que me custa ver umas coxas grossas, brancas, pretas, amarelas? uns peitos pulando para fora, pedindo para serem apreciados, por um dos melhores no mercado? e os rostos. também me dão tal prazer secreto - de ver surgir sorriso bengala e bobo de velho - os bonitos rostos. gosto de rostos sinceros. de olhos pretos ou azuis, desde que sejam atentos e comoventes. de sorrisos abertos, bonitos, escancarados, azulados. os narizes bem feitos, obra-prima do senhor. das orelhas com brincos compridos, da composição toda. e falar em brinco, muito eu gosto das ripongas. são as criaturas mais simpáticas deste mundo. sento-me com elas, e conversamos sobre todas as banalidades do presente. gosto de uma ninfa, em particular, lucinha, nada sei da sua história, nem ela da minha. quando a noite escurece, ela me deixa pegar nos seus peitinhos. ela se ri toda com meus elogios malditos, escancarados. diz assim, sem prazer, só risada 'as minhas tetas são pequenas, só você acha graça nelas' e eu digo 'as tetas são sempre tetas, menina, já pensou sobre escaladores de altas montanhas? são só carentes de tetas, se soubessem da vida, ficariam pregados em subir todos os tamanhos de tetas, a maior aventura que pode ser dada a um homem.' ela ainda se ri, e quando se cansa, tira minhas mãos, e me pede uns trocados para comer alguma coisa. elas furaram-me a orelha com um brinco de madeira, coisa de hippie, e dividem seu baseado comigo. meus amigos dizem que estou ficando louco, e eu lhes digo que se não gostam de louco, podem ir embora de minha casa, e cancelar o buraco de quarta-feira. eles nunca vão. são loucos por jogo de cartas, eu por mulheres. as mulheres são cartas, as novas - sempre as novas - pegamos-na com as mãos, desejamos aquelas que tão na mão de nossos amigos - comumente chamados de inimigos - e tudo que queremos é ganhar tudo. é ganhar todas. eu já não tenho potencial de observador, mas até que a dona morte - mulher formidável, embora me dê um pouco de medo - venha me visitar, continuo a procurar todas essas meninas, minhas meninas, e minha retina vai gravar para sempre a dança de seus corpos.

julho 28, 2009

sobretudo preto e cigarro aceso.

tive amores não-fumantes. e buscarei nunca mais tê-los. minha última, Violeta, ela se chamava. era uma menina doce, vinha de uma cidade interiorana e fazia faculdade por aqui. tinha olhos perdidos e sonhadores. depois que terminamos, encontrei-a à porta de minha casa, mal podendo se sustentar naquelas pernas curtas, e com um cigarro na mão. quando juntos, ela me proíbia de fumar ao lado dela, o que contribuiu para o término precoce do nosso relacionamento. perguntei-a por que que estragava seus puros pulmões com aquela fumaça da maldade. ela disse que aquilo a fazia lembrar-se de mim. e toda vez que tragava, sentia um aperto em sua cona, um delírio infindável, e se perdia nas minhas lembranças. depois dela, menina que nunca mais quis ver, decidi-me por me juntar só com mulheres fumantes. quero, assim, que apagem facilmente minha lembrança de suas cabeças, e de suas almas. quero poder ser livre, e quando o término for inevitável - pois é sempre - que saiamos, os dois, sem feridas tão produndas. alguns cortes na pele nos bastariam.
pensava isso, e andava pela rua. fazia frio, todo o céu era cinza, e poucas pessoas transitavam pelas calçadas. eu era sobretudo preto e cigarro aceso. tenho feições graves, masculinas, gestos ásperos, voz grave. vi-a na outra calçada. era muito bonita, visão cinematográfica. segurava um cigarro nas pontas do dedo, com leveza. atravessei, as mãos no bolso. a gravidade mantida nas feições.
- você fuma?
ela me olhou, divertida. era nova. a vida parecia-lhe um grande parque de diversões, ainda.
- não.
e abriu um sorriso cheio de dentes brancos e tentadores. os lábios eram carnudos e vermelho. o sorriso de uma predadora. de uma vampira, dessas que tem prazer em sugar a alma dos outros.
- e por que segura este cigarro, posso saber?
- para minha amiga.
- e por que assim?
indiquei a sua mão posicionada. puro fingimento. meu desinteresse pela moça já se alastrava.
- para ver quem me perguntaria se eu fumo.
riu, com uma gargalhada curta e pousou seus olhos provocadores em mim. tinha acertado. era vampira, felina, moça-menina; se eu era especialista em términos, ela em conquistas dissimuladas.
ouvimos passos graves logo atrás. a suposta amiga vinha, cabisbaixa. vestia preto, e apenas um cachecol vermelho que balançava com o vento que a tudo levava. seus passos eram lentos.
- ninguém tem fogo.
pareceu não se importar com a minha presença. tinha um corte torto nos cabelos, que lhe dava uma impressão de louca. eu sabia que não. ela era mais triste que louca.
a primeira, com o cigarro ainda nas mãos, indicou-me com o olhar.
ela me olhou longamente, pegou o cigarro, e apenas sorriu. não conseguia decifrá-la. não usou palavras para pedir o fogo que queimava no meu cigarro. apenas se aproximou. senti seu perfume de madeira. seus olhos eram negros e vastos, e usava forte maquiagem da mesma maneira. ela era toda ela, se isso fosse possível. não se deixava ser mais ninguém, apenas o que transparecia na alma. e por isso, era tão mais difícil descobrir quais eram suas táticas.
talvez não tivesse tática.
um silêncio arrebatador se abateu sobre nós três, estranhos, em uma rua vazia e fria.
- vocês aceitam um café? ou um chopp, quem sabe.
- um chopp. e você, lá?
respondeu a felina, abrindo mais uma vez o sorriso. eu já não olhava aquele sorriso arrebatador. se concentrava na sua amiga, mais baixa que ela, mais atarracada, mas incrivelmente mais interessante.
ela deu de ombros, e um meio sorriso, talvez pela comodidade de não ser taxada de antipática. andamos, os três. olhando as duas mulheres, pude constatar que eu me apaixonaria pela beleza da primeira. mas me perderia na tristeza da segunda, e com ela, a minha própria angústia encontraria lugar. e eu sabia que, dessa vez, eu saíria profundamente ferido, como teria querido Violeta. e a menina, só com alguns arranhões a mais na pele já tão castigada.
o mais sensato escolheria apenas se aproximar da primeira mulher. mas eu nunca fui sensato. a sensatez não prova paixões, e era essa, talvez a minha maior busca.
tragei meu cigarro, e quis puxar o significado da minha alma. veio-me só o gosto da paixão.

julho 26, 2009

céu cor de cobre

o céu cor de cobre
permeia o ar de ocre
e o roxo dos edifícios,
tudo cobre.

há fios demais:
é o céu dos pardais
é nosso marasmo sem paz.

(cantam as gaivotas
entoam suas revoltas,
mas ninguém jamais volta
pro azul que se gosta.)

amarelam-se os rostos
acizentam-se os postos
- arrancaram-me os tatos.

quero quero não mais quer
bem-te-vi não te vejo:
não te quero
nem te desejo.

explode no céu uma luz
todo o povo ela seduz
- é luz de pólvora e chama.

chama lá os enfermos
sem perna e sem termos!
para dar-lhes rua dura
e céu noite de estrelas.

é, para mim, gravura
apenas uma pintura
- coisa que se atura.

é feita de sólida solidão
por matar seu artista pagão,
e manchar seu corante
sem a poesia de ser amante.

cidade mundo aqui chora,
se pinta como cor de amora
estende o fim que se demora.

e os corpos nas ruas
vivos se queimam
e ainda brilham, ofuscam
as luzes nuas.

amanhece a chuva,
lavaram as curvas
- a vida é tão turva.

a luz era só a noite
a noite era só a morte
a morte era só um corte
o corte que é sua sorte.

gaviões negros satisfeitos
abutres riram-se todos
urubus em prosa rasa
e o corvo tudo abraça.

julho 24, 2009

cilada

a produção cinematográfica indpendente está morrendo e eu nem comecei a vivê-la. saiu hoje, matéria na Ilustrada, o panorama está péssimo. tampouco, não precisa-se avaliar as produtoras fechadas nos EUA e na Europa, embora os fatos do primeiro mundo ecomm aqui neste país brazilis, apenas as opções de filmes para assistir que temos. Campinas, um milhão de habitantes, quase nada de cinema nas ruas, poucas cinematecas. está tudo concentrado nos shoppings, com seu gosto peculiar às grandes massas, as superproduções juvenis, o vendável, o entretenimento não-saudável. e eu aqui, acreditando no futuro do cinema. e eu aqui, acreditando nos frutos do cinema. mas isso me fez pensar no papel que o audiovisiual tem. é necessário querer transformá-lo mais que mera diversão, em fazê-lo como arte, que visa desarrumar a alma do espectador?

isso me faz lembrar uma profesorra de português minha, no época do boom do Tropa de Elite. ela disse que aquele filme, além de ser violento e ter muitos palavrões, condenava tudo que podia-se assistir ao jornal todos os dias. na hora, fiquei olhando para ela, inconformada. se eu tivesse colhões - ai, que droga de cromossomo X - mas se eu tivesse colhões, teria lhe dito umas poucas e boas. teria levantado e lhe dito que, embora não seja fã número um de Tropa de Elite, justamente por tal obsessão pouco prática e reflexiva dos jovens, achava extremamente importante que notícias transformassem-se em arte. ora, então, senhora, ler Cidade e as Serras é uma besteira, nos dias de hoje, estamos enfadonho das modernidades das cidades. ora, então, disse-me uma vez... a senhora... que seu livro preferido era Dom Quixote. bom, eu digo que qualquer ser humano sabe muito bem da parte que se cala, e da parte que fala, do ser que sonha e aquele que é prático. somos feitos dessas metades, e não é preciso ler Dom Quixote para descobrir. por que a senhora está tão bravinha? sim, eu sei, são obescenidades o que acabo de falar. tanto é a sua colocação infeliz. esta mesma senhora, disse que não queria ler A Insustentável Leveza do Ser porque o filme era muito pornográfico. muito... quê? onde a senhora enfiou a sua extina juventude? onde é que se foi um pouco do seu hedonismo, um pouco do seu Dom Quixote, ora essas, libido, a senhora não tem? acho que só tem cu para enfiar tais opiniões sem fundamento.
para ela falta libido, para mim colhões, mas nós duas temos cu. acho que uma pessoa assim não deveria dar aula de literatura. como é que ela sente, como é que ela pulsa, como é que ela entra na alma desavessa dos livros que lê? mas deixemos a professora, voltemos ao assunto principal.

acho Tropa de Elite fenomenal, como qualquer outro que explore, um pouco, da condição que grupos marginais sobrevivem e como isso se densenrola na ordem social das coisas. acho que o cinema é o um dos meios mais fáceis de atingir o público, sim. pois exposições de arte necessitam tirar aquele estigma de gente culta que frequenta tais lugares, necessitam ser mais abertas, mais cultura. e os livros dependem das pessoas. dependem que elas comprem, se interessem, se dignem ir até o fim, terem tamanha coragem de se ver descritos nas linhas, e continuar a comer, mesmo assim, o que é amargo. os livros são deixados de lado. o teatro, hoje, é uma arte de requinte, que tem que aspirar a vontade de ir, a vontade de se envolver. todas as artes tem estigmas e sofrem preconceitos globais. a população emergente, que é a maioria, é excluída do que é arte, que é direcionada para as classes médias e altas da população. e nem estas classes dão o digno valor. o cinema não tem estigma, ainda. o cinema é cultuado, por todos.

mas aí fica a questão: o cinema cultuado não são todas as superproduções, que se enchem de clichês e roteiros pouco surpreendentes, que vem com valores mastigados para o grande público? o panorama da arte são nuvens cinzas que tudo cobrem. que saída temos, nós? a arte tem que ser salva, antes de sua morte completa. pois não chamarei de arte aqui o que é grotesco, grandioso e puramente vendável.

julho 18, 2009

em branco.

não sei como chama isso, mas é algo como cansaço de ser triste. a tristeza absoluta que transborda todos os poros e toma conta de todo o corpo, atinge a alma feito faca, e faz nascer lágrimas nos olhos. é como dormir por horas, acordar, e querer dormir mais. e dormir nunca é suficiente, pois seus sonhos vem visitá-lo, e a cama é desconfortável, e revira-se em você, dobra-se com o lençol, se esparrama pela dor. é como sentir fome, e toda comida ser intragável. é como querer sorrir, mas todo riso parecer hipócrita. essa tristeza que tem dono e motivo, mas não se vê fim, e por isso é absoluta. nehum livro de auto-ajuda poderá te explicar. os seus membros parecem pesados; seu corpo todo é chumbo. essa tristeza não-cíclica, que se apela ao divino. pede-se ao sol, ao vento, à lua. faz-se macumba e simpatia. medita-se com contas sem fim. reza-se pai nosso, lendo o papel na sua frente. você até iria em um culto. mas não. toda tentativa de apelação parece inacabada, frustrada, vencida pelo cansaço corporal. o peso da alma é o peso do corpo, sempre latente. um topor de querer fechar os olhos até que tudo passe. espero que tudo passe. e que tudo termine bem. a única coisa que se consegue repetir para si mesma são coleções de frases clichês. uma luz infinita, inventar memórias de um futuro-sorriso. mas ter sua memória afetada pelo horror das visões soturnas. as visões enterlacam-se. quero dormir. dormir. e tem que se viver. tem que se sorrir. tem que continuar. o torpor quase vence. não se morre, pois não se pode. se você morrer, alguém precisará de você, lá, quando você ainda tiver força para segurar a mão pequenininha, escondida na sua própria, e chorar de ver seu riso abrir-se. então continua-se. o cansaço tenta, mas tenta também a possibilidade. a sonolência avança, mas sabe-se do sonho. as orações, alguma hora, fazem efeito. farão efeito. terão que.
tudo terminará bem. tudo vai passar. tudo terminará bem. está tudo bem. ok. dorme aqui comigo. fica quietinha, dorme aqui comigo, minha pequenininha.

julho 16, 2009

vontade

vontade de ver inúmeras boas propagandas, porque elas são tão plásticas quanto me sinto
vontade de escrever ininterruptamente para preencher o vazio
vontade de não escrever para ofender minha própria vontade
vontade de não ser, não fazer, não crer
querer que tudo dê certo, se vingar de um deus oblíquo
vontade de ir, sem ter por onde começar
não querer ler outro livro, por sentir os fantasmas do recém-chegado
vontade de me enfiar entre páginas saborosas de fatos absurdos
não vontade de ver filmes
não vontade de rir
odiar o olho que brilha por muito olhar essas telas
essas telas piscam, repiscam, revoltam, e brilham
as telas ofuscam a alma repartida
vontade de estar quebrada, vontade erótica inexplicável
vontade de ter você, sem te conhecer direito
ódio, ódio platônico para verificar a vida em mim
vontade de não viver, desaparecer por uns poucos
de não ter paz, de estar numa ilha, robson cruzué
vontade de montanha, de neve, de bolha de sabão
de chorar, e segurar o choro, prender na garganta
de escalar as escadas do céu e encontrar o gigante que a tudo supervisiona e dizer-lhe
ei, dê me uma única vontade, uma vontade que me valha
pois estou gasta, senhor, estou gasta de não-vontades e falsidade
estou gasta senhor, de mim mesma, dessa minha pele, dessa minha alma mesquinha
dê-me outras palavras preu recomeçar, dê-me outro caminho
faça voltar o tempo das pegadas, faça-me fazer a dor por vias certas
ah! vontade de descer no submundo e me colecionar as almas doloridas
e dizer-lhes baixinho, num sussuro fúnebre, muito me admira vocês, queridas
podem me dar uma forcinha? vou voltar lá pra cima e preciso
e preciso de seu arrepio, de seu susto, preciso de seu sorriso maldicente
veja que vontade de apelar ao infinito
e que vontades fracas são estas
se o infinito nada tem a ver com o terreno que aqui se estende
e com minha sina que não se move
um trem que anda e anda e anda e anda
mas eu estou na estação
eu não estou na estação
eu subi no trem
pra onde ele vai, moço?
vontade de te ter, moço
entre as lenhas do vapor deste trem
e me desfazer no apito que soa e na fumaça que se funde aos céus
e me fazer conhecer tudo que há contigo, moço
para onde eu vou, moço?

julho 14, 2009

é preciso muito ócio.

nestes dias percebo, e não posso negar diante da desvirtude que é a humildade sem propósito, o quanto meus pensamentos tem-se exaltado, saltado, de um canto para o outro, irriquietos, criando concepções para tudo, entendendo cada instante que meu corpo responde com suas reações biológicas, analisando friamente situações ordinárias. isso se deve, mais uma vez penso, ao ócio que esses dias de férias absolutas me proporcionam. é claro que isso está muito errado, pois uma vestibulanda que se preze não deveria ter férias absolutas, mas vejo que... por aqui escrever essas bobeiras sem sentido... perdi já o gosto de estudar, até minhas queridas prioritárias, como história que ainda está parada lá em Roma decadente. mas deixemos essa consciência furtiva, que ás vezes aparece feito fantasma dentro meus pensamentos acalorados, recobrando-me objetividade na vida. ela deveria entender que sou muito pouco objetiva, meus atos, meus sentimentos e tudo mais que pertence à mim é quase tudo subjetivo, quase inentendível, nebuloso até para eu mesma. e talvez por isso me deixo perder-se no mundo aqui que existe dentro da nossa mente.
logo, a conclusão máxima, é que um filósofo, em dignas condições de poder ser chamado de um, tinha tempo (e dinheiro) de sobra. estes seres iluminados, taciturnos à luz do dia, ignorados pela grande parte da população que prefere idolatar profetas com suas certezas imediatas, deveriam (ou devem, essa mania do passado me persegue) andar por aí, para pensar como o mundo deve ser e o que fazer para explicá-lo. eu, na minha santa ignorância graçasadeus, sei pouco de filósofos. acho mui interessante este ramo primário das ciências, mas me contento em observá-lo a distância. o que sei de filosofia está na metade do Mundo de Sofia que consegui ler, duas vezes, e que me fez aprender corretamente a principal discussão de Platão; o que me dá devidos créditos quando alguém cita o seu nome. de resto, nada sei. quando leio artigos que se referem a estes pensadores, penso: Webber? mas o que Webber fazia da vida? ele andava por aí, colecionava seus pensamentos, escrevia-os (como não faço), publicava compilações e era um filósofo? máque? como alguém se torna filósofo, deus do céu? por que existem mil ensinamentos de auto-ajuda do Einstein se meu esterótipo dele era um físico genial que nunca saía de seu laboratório, cuja única foto que conseguiram capturar foi de sua língua infantil e lunática? como Einstein, em sua santa e deusificada genialidade, entendia de como seguir na vida? vê como meus pensamentos saltam instantaneamente de um assunto a outro, sem encontrar solução? zero numa dissertação de vestibular, eu diria. mas como é que se acha solução para tudo?
de tantos filósofos que temos, o mundo parece muito mais misterioso do que o era. é claro que o conhecimento acumulado é infinitamente gigantesco, mas creio que as dúvidas se tornaram a melhor maneira de responder aos segredos do mundo. temos um filósofo Sicrano que diz isso e aquilo, e o Fulano que diz aquilo e isso; diz-se que a credibilidade dos dois é importante, tem-se o terceiro estudande de Filosofia que os confronta, e disso só sai mais pontos de interrogação. as visões de mundo são tantas, se intercalam, e nada explica. a verdade é que, para grande maioria, a explicação mais visível é a sua própria. comunistas e sua crença cega em Marx, crentes prósperos da Igreja Universal, indigentes e suas filosofias sórdidas e desprezíveis, artistas e sua mania de explicar o mundo por subentendidos, acadêmicos e a credibilidade inata nos livros científicos, trabalhadores cansados que querem assistir à novela, gente que acredita mais em Mega-Sena e Big Brother do que em Deus, seminaristas conformados à deriva, chefes políticos envoltos em brumas de corrupção, jornalistas e suas meia mentiras (e por que não meia verdades?), ícones desapropiados dependentes, favelados e sua ambição narcotráfica, gays e sua luta ideológica, neonazistas ocultos por imagens aprovadas pela sociedade, prostitutas e sua sorte abandonada, adolescentes ansiosos pela próxima festa, crianças espantadas com o mundo visto pela primeira vez. cada indíviduo não está nem aí para o que acham os mestres da arte de pensar, pois possuem em seu cerne, também, o proveito de utilizar as faculdades mentais. das coisas mais banais às concepções mais complexas e reveladoras, defendo uma filosofia transmutável e pessoal. e dessa maneira, sei que defendo, juntamente à esta liberdade, largar o mundo ao caos. e que assim, ficará impossível implantar qualquer ismo, fazer acreditar qualquer religião, montar o mundo de qualquer forma social e imaginável. pois o inimaginável do outro, escondido por seus olhos atribulados, é um mundo que deve ser respeitado, que deve ser consolidado. este é um mundo de caos, onde prostitutas dão à luz do dia, velhos fumam maconha no meio da praça, arrogantes não mais contém seu ódio invisível, jovens destroem monumentos públicos. haverá conflitos por toda a parte, haverá citações horrendas, haverá mais pastores do que já estamos cansados, haverá mais panfletos políticos. mas os pastores, como os arrogantes, e toda a gente poderá ver o que há dentro de cada um - e não poderá corrigir, pois dentro de si mesmo sabe o que há de sujo, e que ainda segue, sem um olhar para trás, pois a sua própria ideologia que vigorará. o mundo que eu defendo é horrível, e só pode ser visto em literatura, já que faço parte, um pouco, dos artistas que vêem um mundo veemeente e utópico, à sua maneira egoísta, e o expressam por recursos sórdidos, como o uso correto das palavras dispostas em frases argumentativas. sou profeta da destruição, pois sou profeta da liberdade, e esta, cruel senhora de olhos rapinos, quando atingida por completo, por todos os poros que tangem à pele de todo (e qualquer) ser humano, se proliferará em destruição atômica, lenta, mas atômica. e isso, posso me explicar, é que tenho horror à tortura, a tortura de tudo que podem imaginar - a tortura de nos impor sistemas repugnantes, de formentar nossas mentes com idéias que não são nossas, de nos impor sentimentos que jamais nos pertenceriam, de fazer brotar vontades estranhas à nossa alma, de impedir nossos desejos, de demoralizar a corrida pelo nosso sonho sem nem darmos o primeiro passo, de nos oferecerem o pior pesadelo, forçarem a ir contra nossa ideologia interna, aceitar os preceitos arrogantes do outro, da fome, da imundície, e da limpeza exagerada quando se quer sujeira, do frio, das pancadas, das obrigações, das responsabilidades, do tempo, do cárcere, de estarmos tão cansados que nem mais nos pergutamos, a aceitação plena do que é normal, mortal, ético e racional, de nos esquecermos das perguntas, de nos privar de conhecimento e cultura, de nos privar de ócio, de dar ócio a quem estora de energia, de toda e qualquer tortura. e tudo, meudeus, tudo parece-me uma tortura, uma tentativa de me reformular inteira, desde os ossos até a alma, até meus sentimentos, que deveriam ser irracionais e conduzidos cegos pela bombeamento rápido do sangue pelo meu corpo, e que são controlados... são amordaçados. e por isso, a liberdade, a liberdade é o que mais carece este corpo jovem e já dilacerado, destas mãos que escrevem - talvez não tão bem - mas com ardor, com esperança. com esperança de que ouçam, e de que a liberdade possa ser praticada, mesmo que seja vil; pois toda a maldade que ela desencadeará, não deve ser tão grande quanto essa maldade que nos é imposta - e nem nos damos conta.

julho 02, 2009

do gosto de ser vilã.

e não é à toa que os vilões merecem a morte. Macabéia também morreu, e sua maior inimiga sempre foi a própria vida. só a morte da vida poderia acabar com a vilã intacta, a que é própria de si mesma. escravos também se suicidavam de escárnio, e dizem-me os professores de humanas "assim donos perderão". e diz-me, então, que o vilão da vida de um escravo é um senhor? a vida de um escravo me parece muito passiva de suicídio, além dos fatores socio-econômicos que insistem em enfiar nas nossas mentes pouco afetivas. novelas são recheados de vilões, sotisficados, modelados ao gosto popular. são como os enforcamentos públicos. que júbilo há em ver ladrão se meter nas vias da morte? guilhotinas, fuzilamentos, crucificação. joana d'arc era vilã de quem quando sentiu o cheiro da própria pele carbonizada? socrátes morreu pela paz de vossas mentes. deixa de tolices. a história só se faz encriminando vilões, que tornarão-se heróis. jack, o estripador era um vilão? hitler, condenado pelos valores pós-segunda-guerra, o maior vilão de todos os tempos. ninguém o matou. ele próprio desferiu contra si o suspiro de alívio de multidões aprisionadas. alguém me aponta quem merece guilhotina, bush e sua corja ou os terroristas islâmicos? turbantes e barbas devem ser punidos da sociedade justa e democrática que vivemos. nossa sociedade é vilã? mataremos-nos, então. assim o mundo estará limpo deles. assim a paz e o progresso reinarão.

mas estes vilões são periféricos na nossa imaginação. a rotina nos distancia de nosso ódio, que só é retomado por alguma iniciativa externa. aqui dentro, imperam os vilões das nossas vontades. e não há seleção afetiva de vilão: filhos matam pais; pais matam filhos. o herói facilmente é convertido em vilão, ao contrário do que nos mostra a história. na nossa vida, única e finita, ultrapassamos diversas vezes a linha do amor e do ódio. cá pendendo aqui, cá pendendo lá. o nosso desejo é o rei. e declaramos guerras constantes aos inimigos externos. há intensa campanha ideológica a favor desta guerra. todos os membros se enrijecem, adrenalina corre no sangue, já não nos atentamos para nossos compromissos. alma, corpo e mente, que diversas vezes conflitam entre si, são um só. pela primeira vez, frente a um inimigo comum, um só. e como únicos, marchamos, cegos pelo objetivo da destruição. mesmo que a destruição seja interna. como destruir uma imagem que vive dentro de si mesmo? são projeções incansáveis que distendem por toda a alma, roubam cada pedaço. e ser inimiga de si mesma, como a vida de Macabéia era dela mesma, dói. sei que dói.

ser vilã, e não histórica onde se resguardam pelo menos páginas do livros escolares, é também dor crucificante. sabe-se do estrago, da ferida. e dentro de si, há apenas uma culpa que não se entende, como um comichão que incomoda, vem pelos pés e sobe até a cabeça. sabe-se, porque noutra vez, também já teve um vilão. e se liberassem nossos instintos, se abolissem as leis, mataríamos, sem dó, em praça pública, revelando-lhes seus crimes imperdoáveis. transformaríamos nossos vilões, mesmo que internos, em vilões históricos.
e sentir-se como apregoado na cruz, com o pescoço entre a guilhotina, rasga a alma, pouco e a pouco. sua mente, seu corpo e sua alma estão em (in)constantes conflitos. não se juntam ne unidade, apenas lhe apresentam o estrago. o vilão, parado, sem reação, apenas recebe as chibatadas. vem de si mesmo, e não do mundo, como ele pensa. vem daqui de dentro, como se machucar também fosse sair machucado. e diram os físicos, eis a ação e a reação, se deres um soco na parede, também a força atingirá sua mão. também a força o consome de todo, pois energia nunca pára. vai, volta, reviravolta. também a força é grande vilã do vilão, e talvez os heróis agradeçam por isso. merecemos isso? sim. sim, pois todos os vilãos merecem a morte. e não morte total, se tratando dos assuntos da alma, mas uma morte instantanea de algum pedaço de dentro, que desiste de fazer parte de tal corpo pecador. um pedaço que se perde aqui, acolá, sem poder atingir a felicidade coletiva. a felicidade coletiva é uma mentira; os vilãos são verdades absolutas dentro de cada um. podem não ser eternos, podem até ser ocultos, mas por um segundo, tornam-se objeto de matar e morrer. e se morrer. os vilões também morrem, também sentem o gosto do veneno que queima a garganta, o fogo que se alastra pelo corpo, o escuro dos quartos vazios e imundos. ninguém, nunca, está livre. e em todas as relações, em todas as relações, até naquelas baseadas em razão cega e desmedida, ninguém está livre de sair ferido, corroído. de ser atingido, como as águas revoltas que a tudo destroem, sem escolha, nem piedade.

piedade, os vilões merecem a morte.