novembro 30, 2014

bandidos

eu escondo os meus dedos moídos. a arcada dentária dói. olha para mim! enrosco a língua no seu umbigo, você dorme, meto-a logo no buraco, você geme de olhos fechados, vou logo metê-la nos seus olhos.

olha, querida. eu estou te esperando. 

ele me olhou e falou rápido, incrivelmente rápido, naquela entonação que tudo termina em reticência, pergunta e responde. se alguém o desafia, finge que nada aconteceu. os bandidos e etc. os bandidos e os bandidos e os bandidos e os bandidos. 
no fundo, te escreveria uma hq onde você é anti-herói bandido, malandro e mentira, serhumano de falácia, verdadeira carne ferida, olho vermelho, maconha maconha maconha. vagabundagem e pilantragem da boa.
mas você nasceu supostamente rico, num bairro limpo e de gente de bem, calçadas bem varridas e lojas envidraçadas, as placas não são luminosas, são acolchoadas, tem colchetes, arredondadas, design e conforto, clean naif gourmet vegan. teu ódio é desproporcional. não cabe nestes quarteirões, se esbeira nas praças meio mal cuidadas, de flores amarelas de terrível gosto, brinquedos enferrujados, e você moleque caçando passarinhos. e você homem dando tiro na ratazana do canal aberto. 
e os moleques da zona leste. você me disse, lá na zona leste, ninguém mexe com os bandidos. 

dentro do carro, percorro a paisagem campineira à busca do pouco de zona leste em que estive: inconcebível. nenhuma imagem, nem alegoria, sequer uma rua, se não, apenas e totalmente, na paisagem, seu rosto. os moleque da zona leste, ele disse, e seu rosto flutuava à minha frente. murmurei tristemente sem saber o que dizer; na maior parte das vezes, minha retórica política é falível e eu a perco, mal a começo, não sei dialogar. me espreguiço mentalmente. e moralmente superior, talvez. nesse momento, porém, queria apenas atiça-lo: minha mina é zl.

que bandido você seria. morreria jovem. teria mais outros filhos. outras mulheres que amaria. bateria em tanta gente. mataria. seria rei - corrente de prata pesada balançando no peito. cifrão. filhos sem pai. bala na polícia. bala em viado. ajudaria as mães. as pessoas que julgaria boas. cuspiria de ódio no seu bairro limpinho. sujaria a cidade toda. traçaria planos de matar um político. de implodir a prefeitura. morreria antes. muito antes. desgraçaria o que poderia. seria rico. e vagabundo.

te botaram no seio da contradição. onde pra ser bandido você tem que fugir, ou sua bandidagem está nos pequenos atos malignos: não pagar uma ou outra conta, nome sujo no banco, bate em mulher muito nervoso. onde pra ser bandido, você não pode. cuida do seu bairro e da sua calçada. maldiz. e tem que trabalhar. e xinga os vagabundos. e odeia trabalhar. termina as frases concordando com si mesmo, mal ouve os outros. 

essa coisa. os sujeitos que se tornaram cem por cento puderam nascer ou vencer as contradições. bandidões, anfitrões, artistas. 
eu e você somos toda tomada disso. comemos disso. e nos mantemos por isso. 

não terminemos a falar em reticências.

obrigada.






novembro 27, 2014

esses meses passaram rápido como um trovão.
eu quase nem vi.
você diz que a gente não se pertence mais, mas
eu estive tão dentro de você
(e depois tão dentro de mim, porque era você)
que eu mal percebi o que eu vivia.

eu vivi para você até perder a sua dimensão.
mas
você ficou pequena dentro de mim.
você me comeu e eu achei que eu-você era eu.
as mágoas e os escapes, os mesmos.
eu não sei mais como é o seu rosto.
o seu corpo.

não seja tão dura comigo. 
eu sou ato-reflexo. perdi.

pensar em te perder é como morrer
um pouco.
não seja tão dura comigo.