dezembro 30, 2008

era ano novo.

José Paulo já tinha lá seus quinze anos. talvez desesseis. toda a virilidade dos dezesseis. e toda a vontade que não cabia dentro dele de provar algumas bocas e bocetas. mas era, como eles diziam?, um menino da roça. se não fosse pela pele queimada de sol e os braços já fortes talvez não desconfiassem tanto assim. até que abrisse a boca para falar. não era só aquele sotaque incompreensível de erres, era todo o seu intelecto transformado em ditados populares e sabedoria de terra vermeia. não havia muitas meninas lá, no seu canto de terra, e sentia, com pesar, esse drama. as meninas da escola que frequentava, na cidade mais próxima, não eram cabritas tão bonitas e não estava muito interessado naquele jeito tímido e difícil que elas, ainda, insistiam em fingir ter. talvez casasse com alguma delas, era óbvio que se casaria, mas por enquanto ansiava as loiras ousadas dos videos pornôs que via escondido.
mas era ano novo. e vinha lá aquelas primas de são paulo, a capital, e trazia as amigas. não eram tão sensuais quanto as loiras de seus vídeos piratas conseguidos a difícil custo, mas era o que mais se aproximava.
estava sem camiseta, na sala, esperando, o corpo rígido; não sabia porquê já se prostava ali, examinando seus braços queimados e os músculos delineados perfeitamente. mas, de repente, entrou pela porta uma das amigas da sua prima. meupaidocéu, que maravia. a menina tinha uns peitos grandes, o maior que ele já vira em menina daquela idade, e usava uma blusa decotada, podia ver as formas redondas pulando para fora, como se quisesse chamar suas mãos trêmulas. um descoro! ouviu as meninas da sua escola em algum lugar da sua mente. era loira, um loiro meio branco. veio um pouco tristonha, de cabeça abaixada. quando ela o viu, deu um sorriso, sentiu-se observado, sem algum pudor; resolveu sorrir de lado, tímido. ela logo acomodou-se do seu lado, bem perto, sem nem convite. essa a mamãe não aprovaria.
- oi, você é primo da isa né?
estalou um beijo molhado na bochecha. seus lábios rosados pareciam derreter-se por todo o seu corpo, parte a parte. hoje é meu dia, óóóia, hoje é meu dia, pai. ela tava de shorts, as pernas grossas, bronzeadas, tocando a dele.
- você não quer me mostrar umas plantações, mêu? eu não quero morrer de tédio.
a voz dela era clara e alta. ele não gostava muito da voz, mas o resto compensava. sorriu, parecia que seu corpo todo endurecera feito gelo. levantou-se e disse que era para segui-lo. logo estavam entre as flores perfumadas de café que enchiam as plantações. aquelas flores eram muito bonitas, ele achava, e ela o ouvia dizer isso, sem muito interesse. ela estava interessada nele, e só nele. ele não sabia se devia dar uma daquelas florzinhas branca para presenteá-la. achou que era uma coisa um tanto estúpida. ficou parado, olhando-a, uma mão coçando seus fios de cabelo cor de terra, a outra pendendo ao lado do corpo, sem jeito. ela aproximou-se.
- você tem medo de mim, menino do mato?
colou as suas pernas nas dele. ela sentiu o seu pau duro, duro como todo o resto do corpo. ela riu, divertindo-se. passou a língua atrevida pelos lábios.
- eu tenho a fórmula pro seu medo e pro meu tédio.
ele queria que ela se calasse, fazia ele se sentir um passarinho, mesmo com todos aqueles músculos, era só um passarinho encurralado numa baita armadilha. má que armadilha, homi. mostra pra ela que ocê não é frouxo igual os que tem lá na cidade dela. repetiu a última frase com a voz mais grossa que conseguira. ela deslizava a mão pelo seus braços, apertava a pélvis contra o pinto. enfiou a língua travessa na boca grande que ele tinha. ele liberou o bicho que adormecia dentro de si num segundo só. jogou-a, sem qualquer cuidado, na terra. segurou forte seus braços, enquanto deitava-se sobre a menina, pressionando todo o seu peso contra aquele corpo cheio de curvas. sentia suas pernas enlaçando-o, ao mesmo tempo que ela parecia fugir daquela brutalidade instântanea, tentando soltar seus braços. ele suava, ela continuava com a sua língua irreparável. as mãos dele apertavam forte os peitos grandes, os maiores e mais bonitos melões que já colheu um dia. ele sentia o cheiro da saliva dela misturado com o de suor que irradiava do seu próprio corpo queimado. quando suas memórias mais mesquinhas eram um punhado de pó insiginificante, ela abria o zíper da sua calça e deslizava a mão por debaixo da cueca passada e lavada pela sua mãe, que deus a tenha.
- acorda, que as visitas tão chegando, fio, vai pra sala.
a cabeça da mãe desaparecera pelo vão da porta. os lençóis estavam manchados. estava completamente suado. mas era só cheiro de homem.

a única amiga da prima que chegara tinha cabelos pretos que escondiam os olhos, era magrela e, por toda a noite, não botou sequer uma vez os olhos nele. mas sempre haveria um ano novo, disso ele tinha certeza.


(feliz-ano-novo.
afinal: não desistam; sempre haverá mais anos novos.)

dezembro 29, 2008

a cigana

a cigana dissera que, por seu cabelo ser muito avolumado e enrolado, atraía e guardava muita energia negativa. explicara rapidamente que tudo que fazia parte de nós captava energia dos lugares que frequentávamos. diante da decepção da moça, ela deu um sorriso de desculpas e disse que a cor da sua pele era ótima para espantá-las. mas o cabelo, o cabelo, não adiantava.
ela pensara que ciganas eram pessoas espalhafatosas, vestidas de cores fortes, com argolas douradas grossas penduradas nas orelhas grandes e cabelos tão mais volumosos quanto os dela. achava-as umas charlatãs, mas resolvera, sabe-se lá porquê, visitar a dita cuja. mas aquela, uma amiga a recomendara, era diferente. ela vestia uma bata simples de mangas compridas que ia até os pés. a pele era branca e os olhos de um castanho infantil. os cabelos, obviamente, eram lisos e colados ao rosto fino. ainda assim, tinham um corte curto chanel reto e sem graça. não tinha nem furo na orelha, assombrara-se a moça. ela mandou-a sentar no chão, e apoiar as costas em almofadas de cores zen. talvez fosse da linha zen-budista. ou espírita. ela não sabia muito bem a diferença. o lugar tinha cheiro de lavanda, e não de incenso estranho, e isso até a agradou, impedindo-a de xingar a tal cigana.
- qual a solução?
é cortar o cabelo, bem curto. é cortar o cabelo, bem curto. aquilo ressou distante dos seus ouvidos, como se fosse algo de possibilidade remotíssima. em seguida disso, ela começou mais a parecer-se uma cigana cinematográfica. preveu pequenos desastreses (que já aconteciam) devido à energia acumulada. e disse que seguisse seu precioso conselho, sua vida daria uma guinada. a moça preferia a zen-budista que essa profeta mandona.
- que guinada?
você vai conhecer um moço bonito. um daqueles que te pegam pela mão e levam para passear na rua, e a rua continua sendo feia, mas você a vê tão mais bonita. são esses caras, esses mágicos, ela comentou, esses mágicos que fazem essa vida valer. deu um sorriso sincero, pela primeira vez, e ela pode observar como os dentes eram amarelos e feios. parece que seus dentes também armazenam bastante energia negativa, senhora.
é claro que ela não seguiria nenhum conselho; mas diversos desastres tomaram conta de seus dias adiantes. esqueçera de desligar a máquina de lavar roupa, o bilhete único deu problema que lhe rendeu disperdício de duas horas do dia, e muitos reais a mais na conta de água. o celular caiu na privada e perdeu a sessão do filme que ela tanto queria ver. tropeçara e ralara os joelhos, imaginando quanta energia negativa devia estar acumulada com aquele sangue seco, mais parecido com ferida de criança. a pipoca estava de gosto péssimo, e o café tão forte que quase engasgou e cuspiu na cara do garçom que vinha de olho no último mês. ela não gostava realmente de café. olhou seu cabelo, com crescente desconfiança e repúdio, e foi aí que deixou cair o espelho de mão. o espelho rachou. oh droga, sete anos de azar, e eu já tenho tanto!
diante de tantas perspectivas, já não tinha carinho pela juba negra que se entrelaçava, de maneira selvagem, acima do couro cabeludo.
- corta aí. corta curto. só não me faz um corte sem graça. eu sempre fui moça marcante.
ouviu as tesouradas rápidas, de olho fechado. estava com medo de olhar o grande espelho do salão e este rachar. estava farta de tanto azar. enquanto ouvia zip! zap! imaginava se agora sua vida mudaria de direção, como a maldita cigana falara.
na esquina da sua casa, morava um moço que usava óculos quadrados, pois tinha miopia de sete e meio graus, e camisas listradas com botões cor-de-bege. o moço, em suas pobres horas vagas, passava pelas ruas procurando por nucas, gostava do desenho das nucas, gostava de como desciam até os ombros, os ombros bem feitos de mulheres pequenas, gostava tanto de nucas, e por isso, gostava tanto quando elas podiam estar à mostra. queria desesperadamente uma nuca só para ele.
a moça olhou-se e até que gostou do cabelo. passou as mãos por eles e sorriu, de leve. levantou-se e seguiu, sem um tropeço qualquer, para a vida que se garantia à frente.

depois de dois anos, mandou rosas à cigana. rosas brancas.

dezembro 27, 2008

fusca azul.

ele foi lá e escolheu um fusca azul calcinha.
simplesmente porquê gostaria de ver garotos e garotas e até marmanjos (em um lapso fiel à infância) se esmurrando, em brincadeira, quando passasse. sabia que, para os mais entusiasmados, a brincadeira poderia perdurar dias de vingança só para avistar primeiramente algum certo fusca azul. intimimamente, sua alma sorria, porque sabia quantos sorrisos desavisados explodiriam pelas ruas cinzas.
ele achava que o mundo continha menos fuscas azuis agora, do que quando era menino. entre outras coisas, isso provava que o mundo estava, realmente, no seu fim.
ele ficava contente de ter feito algo que, de alguma maneira, salvaria o mundo.
ou, pelo menos, retardaria sua completa perdição.
por isso, ele foi lá e escolheu um fusca azul.

dezembro 24, 2008

my fault.

você se tornou indiferente. você acha que é uma grande coisa, que faz parte de um seleto grupo de pessoas superiores o bastante para se envolver em emoções simples. faz dois anos que você não escreve no seu aniversário, não sabe escrever sobre você. superficialmente, você acha clichê. no fundo, é medo. quando você era pequena, gostava de escrever como as pessoas tinham esquecido o verdadeiro sentido das comemorações. dizia que na Páscoa, não eram chocolates, mas renascimeto. dizia que no Natal, não eram presentes, era Jesus. dizia que ano novo, não eram fogos de artifício, era vida nova e planos excitantes. depois, com o encéfalo um pouco mais carregado de informações vinda de todos os cantos, você achou melhor criticar. o espírito consumista do natal. a hipocrisia da família reunida. as listas que sempre falhavam, as retrospectivas pessimistas. você era uma adolescente. você continua sendo uma. mas já não escreve nada. é clichê comentar da celebração em família e mais clichê ainda falar que é tudo uma falsidade cultural imposta de cima para baixo. todos já sabemos disso, e você se cala. pouco a pouco, as comemorações perdem sua cor. você já não é criança para esperar ansiosamente pelo seu presente. ou pela festinha com seus amiguinhos ou familiares. você prefere ficar quieta e sozinha. por quê? o que resta a você é um pouco daquele pessimismo enfadonho, essa tristeza branca. você sente esse vazio. está tudo branco demais para se esforçar em colorir. os seus desejos são reais? você quer poucas coisas que podem ser pedidas a algum deus superior, agora. essa apatia te engana. parece que você é out demais para partilhar do tal sentimento que contagia todo mundo. parabéns, você consegue ser apática.

você se tornou ácida. se fosse se definir sem medo, diria que é apática, possessiva e ácida.


o que você fez todos esses anos?

dezembro 15, 2008

histórinhas de fim de ano.

de quem tá saindo. de quem tá no terceiro ano. de quem tá cagando nas calças. de gente como eu e mais meio mundo, para não ser tão egoísta.

sabe o que me pertuba um pouco? aqueles desconhecidos que você gosta. aqueles meio-conhecidos que você nutria certa simpatia. aqueles sujeitos que você olhava na escola e dizia 'cara, um dia ainda vou te conhecer!' e nunca conhece. nunca, agora é real. porque não virão mais dias na escola para você esbarrar "sem-querer" na pessoa, comentar sobre o tempo ou reclamar do ônibus. mesmo aquele cara que você achava que não era tão legal, mas que passava e fazia uma piadinha infame (talvez a mesma) e que você retribuía (a mesma também), mas que faziam vocês rirem (espontaneamente, por incrível que pareça). bem, acabou. raramente você tornará a ver o semi-conhecido. o quase-amigo talvez uma ou duas vezes nas férias, dependendo da reciprocidade. o desconhecido, apenas e somente se o destino ajudar. de qualquer jeito, sem espreitar os outros nos intervalos e entre-aulas; sem ouvir metades de conversa e elaborar teorias esquizofrências a respeito da vida alheia; sem verificar os casais que formam e desformam em uma velocidade absurda; sem cogitar a amizade efêmera; sem analisar as diversas panelinhas em seus cantos da escola ou surpreender-se ao ver tal gente em tal panela. enfim, morte às fofoqueiras de plantão e as que levam uma vida sem emoção!
mas logo eu que me seinto um pouco atraída pela vida alheia! a escola era um grande lugar para exercer meu poder de tentar descobrir o que há por trás de todos e de tudo.

(esse final soou meio ficção épica, mas deve-se ao fato que eu estou lendo aquela série - talvez cretina, não gosto de opiniões públicas - Torre Negra).

um bom fim de ano a todos os meus desconhecidos, quase-colegas, quase-amigos, quase-conhecidos.
espero que vocês levem uma boa vida

ou não.