agosto 22, 2011

amor de cheiro

pele e mucosa, pele, arrasta. arrastão-arrasta-não.
amor de cheiro, de perfume, de fumaça.
de cinza dos olhos, aroma de chuva na sua pele:
fizeste chover dentro dos meus olhos, castanhos
estranhos olhos seus, delineados de borra negra
respingastes dentro de mim, mucosa, pele, borra de café
café, limão, açúcar, doce mel onde não cria-se abelhas
colméia de ti, cachos de mel, enrolados entre si
entreabertos em mim, te desejo, te consumo
rugido de leão, amor de cheiro, de ronronar
juba de mel, amor de café, cheiro de chuva
sorrirei se o dia nublar, sorrirei se o sol sorrir
se qualquer tempo me faz sorrir, o seu me faz chorar
choro de chuva de verão, de longe ficar,
pele na pele, amor de pouco em pouco
e a chuva vem, e eu que tenho medo de me molhar
- e eu que águo e deságuo e desabo em ti:
rugir de tempestade, cachos de mel



agosto 07, 2011

língua nos teus

minha língua nos teus dentes, teus afiados dentes, meus. minha língua a desmanchar-se (em vermelho-vinho-vivo) desmembrada carinhosamente por teus. e em contraponto com todo o macio da boca (seus lábios me matam) e a gengiva salgada, sangrada, e a língua macia, desenvolta, a desenrolar em círculos, mas mais do que isso: teus, dentes. duros, pontiagudos, resistentes, em riste. ali por eternidades de vícios. teus. meus, dentes. ósseos, amarelados, calcificados. a tudo superam e a tudo trituram: ali, sem pensarem em ceder ou desistir, ali, sem bambolearem ou se desmancharem, ali, existentes, ali, enraizados, eternos. quero lamber tal eternidade de razão, tal tão concreta existência de persistir, tal coragem de permanecer. quero nos mínimos detalhes e orifícios esconder minha - vadia, lânguida - língua, descobrir, desvanecer, puxar do sulco ácido dos seus dentes críticos. e dos meus, nos meus, me espetar, me ferir e vermelho, e dolorido, doer. para então, estar, fazer, ceder à quietude daquilo que é, que está em mim, prisioneiro de, ficar. nos teus, me deleitar em fazer dos permanentes-dentes-de-leite. de leite, me esfalecer, nos teus. me encontrar, me encaixar e ali - ficar, língua nos teus dentes, ser, por tanto e em tanto, sofrer, quieta, e sempre, sentir. não mais sorrir, teus dentes, aqui, dentro de mim, e só, usá-los para mim, para me deliciar, para me provar da permanência do mundo como mundo, dente como dente, isso e isso. e então, dormir, com a língua dentro dos teus, dentes, dentro dali onde não se vê quando se sorri, dentro, do preto, do branco, do vermelho de dentro de um qualquer dente - o teu, que é meu. minha língua dentro de dentro dos teus, meus dentes.