fevereiro 01, 2010

eu mesma.

sou eu mesma desde que nasci, se nasci quando me lembrei, se minha vontade criou-se do nada, ou tudo isso é memória recriada para parecer mais fantasiada? gostava mesmo dos livros encadernados, cheio de figuras, gostava do nome do escritor na capa. isso é presencial. talvez eu quisesse ser estrela - vamos parar de romantizar o meu passado. não é só porque eu nunca quis ser modelo, que não quis ser famosa. quis ser escritora, e ser famosa. obrigatoriamente. assim como a maioria das modelos não se tornam famosas, tampouco as escritoras. o mundo da moda e o mundo das artes se confundem muito facilmente.
então esta ilusão que sempre fui eu mesma, sempre introvertida e tímida, nenhum acontecimento me fez ficar assim. talvez alguns tenham intesificado, mas a personalidade veio intrísica aos olhos fugidios. e esta mania de desistir? não sei se foi criada, mas sempre me pareceu presente. talvez, então, tenha sido eu mesma, desde que nasci, lendo um livro, chorando escondida, gritando.
mas o mundo sempre se expandiu. o mundo sempre mudou! e eu me expandi com ele, eu não mudei um pouco de cada vez: foram explosões no espírito. no espírito do mundo. a primeira que tenho clara: quando mudei-me para o primeiro ano para o Bentão. saí de escola particular, pequena e apertada, sempre tive os mesmos amigos - crescemos juntos e agradeço por isso. descobrimos as coisas lendo na internet, compartilhando impressões assustadas, delineando nossas próprias personalidades teóricas, que não se repetiram em igualdade em nenhum de nós.
e então, o mundo novo se abriu. era tanta gente, era tana informação, era tanta coisa na prática: e foi tanta decepção. logo eu, queria entrar num mundo maior, num mundo de filmes punks sujos, e me encravei por pátios abertos, pelas turmas populares (enganam-se então, os filmes americanos, estas turmas populares, por excelência, acumulam um tanto de gente que os odeia, e não os inveja de jeito nenhum, e os populares na verdade, são os nerds, estranhos e losers). mas tudo foi uma festa: assim me lembro do meu primeiro ano, uma grande festa. eu estava espantada a todo momento, mas não podia deixar meu queixo caído o tempo todo. eu tentei me expandir a todo tempo, eu me adaptei rapidamente: logo, eu amava esse novo mundo.
mais recente, um outro mundo se abriu, muito mais real e sujo, quando entrei no cursinho. ainda bem que fiz cursinho, pois não estaria espiritualmente preparada para uma faculdade. novamente me assutei, e novamente fingi que tudo era normal, para os outros, neguei a mim mesma um passado de amores platônicos e desistentes, loucuras normais e conversas fúteis. finalmente: aqui estou. hoje sou menos culta do que nunca; embora sempre busquei isso. hoje, já tenho preguiça de citar livros e filmes, tenho preguiça de esconder meu preconceito, de não formar estereótipos. e também, hoje sou mais real. tenho até preguiça de conversas filosóficas em certos momentos, e do bom e correto sempre bem intencionado. estou propensa à loucura fútil e busco isso: busco uma dose de alegria na vida amarga. e poderá me dizer, então, ah que vida amarga o quê, que adolescente boba, que adolescente boba! este esteriótipo me percorre por toda vida. ainda peço desculpas por ser uma adolescente boba. mas veja bem: a vida me amargou já, a vida me deixou triste e pesada, me recobriu de chumbo, e foi quando eu vi outro mundo.
vi outro mundo quando descobriam o tumor da minha irmã, o meu próprio mundo, o meu espírito conturbado, o negrume de tudo, sim! e vi um mundo que não conhecia, só ouvia falar, o mundo da luta por doenças ingratas e sem explicação, misturado à falta de dinheiro, tempo, misturado ao cansaço de tudo, à vontade de desistir, e o amor. um mundo de amor e cansaço se abriu para mim, e o que parecia contraditório, na verdade, se fortalecia. não existe luz, sem sombra, já diziam tantos. este mundo fortaleceu meu lado mais íntimo: não era a vida (a grande festa) que se mostrava, mas sim a morte (a grande dor), face a face. conhecer a morte é um dos caminhos mais dolorosos para entender a vida, mas, por isso mesmo, perdura como não cem mil festas ou conversas profundas poderão nos ensinar.
vi mundos diversos: vi meu mundo desabar ao ser assaltada pela primeira vez (na verdade segunda, mas na primeira só tive vontade de rir - histórias à parte). um mundo meu que primava pela justiça social e pela bondade da natureza humana se desfez em alguns segundos de pura raiva. eu não pude entender - eu ainda não entendo - logo eu? olá, assaltante, eu estava disposta a mudar essa merda de sociedade por você, mas por que você faz isso? por que fala que vai me matar? eu já conheci a morte, você não deveria fazer isso comigo, você sabe, eu sei que você conhece a morte mais que eu, tão mais, que ela é banal para você. para você, então, conhecer a morte não fez celebrar a vida, e sim, tornar a vida um fiapo, um nada, facilmente eliminável. são destas coisas, não são? são destas coisas que me faz ter sentimentos nobres - eu disse que estudei em escola particular? - que me faz parecer superior, mas todos estamos num barco, mas o seu está mais furado que o meu, vê? e esteve afim de me afogar, já que o meu barco continha um buraco talvez consertável.
e o mundo se expande continuamente, e a minha alma aqui dentro modifica-se a cada expansão, mesmo que seja contraída, e fique com medo, que medo deste mundo! e mesmo com todo este temor, eu peço, quero que meu mundo se expanda mais, para assim, eu tornar a me assustar, e ter que me adaptar, e ficar por uns segundos eternamente encantada com o mundo novo apresentado.
mas os mundos se vão e são suplantados por outros maiores, continuamente, será? ou será que essa é uma fase adolescente, e quando os sonhos se vão pela realidade crua e tosca, o mundo tende a se tornar menor? cresce até não poder mais, como um balão, e com o passar dos anos, oi balão perde ar sozinho - não é sempre assim? - torna-se mucho e fraco, sem graça, até acabar por se esvaziar sozinho, ou então, alguém o estourará, irritado por este balão fraco e desajeitado - desaptado ao novo mundo.
espero que os mundos não sejam balões... mas será melhor estourá-los quando estão em sua fase melhor? cheios de vida, cheios de planos, cheios de cores, de um mundo grande, e você, andarilho, pronto para conquistá-lo e engulir tudo que lhe mostram no caminho? a morte será a explosão em pedaços rasgados de um mundo, e a eterna ilusão do espírito que ficou preso no mundo das maravilhas.
não sei, como eu saberei? por agora, o meu mundo se expande, e eu acompanho, saciada e feliz, por sempre me modificar, e por isso - então é por isso? - eu não sou quem nasci, de tanta modificação, mas ainda restará um pouco de mim em qualquer mundo que eu pise, não? ainda restará uma força mínima que me acompanha desde o nascimento, e esta força, que acabará por me enterrar debaixo de sete palmos de mundos pesados.