novembro 03, 2010

fixo

era quando os olhos dele se fixavam em mim. quando eu sentia aquele olhar, e aquele olhar via minha alma, meu fundo, minha ânsia, minhas entranhas se contorciam todas. era uma coisa estranha - um nó no estômago, um frio na barriga, arrepio na espinha. e ia descendo todo o mal estar, o incômodo, feito veneno goela abaixo, ia dar no ventre, ia melar-me toda, ia raspando tudo, ia me contorcendo, me desobedecendo, me enlouquecendo - assim, por dentro. mal sabia agir. perdia tudo, perdia o ar, perdia a fala, a concentração. já não sabia do que dissertava. mal sabia do que estava rindo, instantes atrás, esquecia a piada no meio do caminho, uma história não terminada. tinha que da um gole da minha cerveja, ou do meu café, não sei se era para um tempo meu corpo voltar a ser meu ou se alguma substância (quem sabe o álcool ou a cafeína, então) remexia no fundo o grosso e me ajudava a fingir que estava tudo bem. está tudo bem. agora passou o olhar dele, foi se embora, concentrou em outro alguém, em outro algo, não importa. mas eu queria estar em seus braços agora, não sei, de um jeito que você fizesse minhas entranhas pararem de se contorcer. ou se contorcerem até nunca mais voltarem, irreversível, e então - ah! nem sei se aguentaria. e então ah...! no fundo eu torcia que você me desse outro desse olhar, eu brincava com seus olhos daqui para lá de lá para cá, pra você atingir a medida certa do olhar. a medida certa que me faria perdida, me faria rainha. rainha de mim mesma, caos intermitente, fluxo, sangue e corrente. meio dor, meio amor. ou nada disso - é que não tem nomes, não tem palavras - era só aquele olhar, só aquilo me bastava, e aquilo era sem nome, sem definição, sem jeito. vinha sem escrúpulo e me fazia regurgitar. e eu ali, parada, sentada na cadeira, sorrindo, como se nada tivesse acontecendo. como se eu não estivesse louca por seu toque. como se eu não quisesse engulir o seu olhar. parada, sorrindo, tentando disfarçar.

e depois passava - sempre passava, e eu voltava a ser eu mesma, rindo, falando não-sei-que-lá. e você também. como se não importasse, como se não fosse nada... mas aí, talvez seja nada, talvez seja nada, mesmo, talvez... deixa quieto e passa um café pra mim, por favor.