agosto 20, 2012

a menina acrobata

a menina poeta. fazia poesia com o corpo. corpo sólido e só, morno, de toda uma cor. cor de nada: era filha de português com índio, vô alemão, vó africana. de áfrica ela falava de cor sei uns dialetos. diletante, andava nas pontas dos pés. apesar de sorrir, era triste quando podia. quando podia, porque há de ter tempo para ser triste. quando triste e quando alegre, se pendurava. como pêndulo, balançava. balanceava os corrimões, os postes, tudo que era possível trepar. de trepa-trepa desde menina brincava. brincava sorrindo sozinha no banho, fazia alegoria. alegrava a cor daquele buraco que se metia. mexia e remexia o corpo todo elástico de um lado a outro. doutro lado era sóbria, mas lá, era leve. leviana, virava o corpo e desvirava de novo. de novo, de novo, de novo, aplaudia a plateia soberba. sobrepujavam, pulavam, ululavam. de honolulu, a menina dançava de um jeito típico. se típico ou não, também o banzo que sentia. sentia e sofria saudade que não entendia. desentendia de enfiar os pés debaixo da terra. terra roxa deste país, lamentava. lembrava lambendo os beiços: que óbvia. de obviedades dessa órbita estava cheia. cheia, dançava acrobacia enfadonha e cansativa. cansava a plateia fascista, que de pouco a pouco foi-se indo. ia ia sem voltar. e a menina triste dançava com seu jeito lúgubre. lúdica nunca mais o fora. lúcida, dizia baixinho, fiquei, de repente. repentinamente, decidiu. decidida, na ponta do pé de bailarina que nunca o fora, pendurou-se a fim de morrer. morreu estendida. estendeu o espetáculo aonde podia: toda a avenida parou. parou no ar antes de cair, o corpo quase refutou. mas o que está decidido pela alma, está. e caiu sem baque no chão.