querido,
faz frio aqui. se saio à rua, e saio pouco, tudo chamusca. os restos. as casas. as pessoas. queimam porque o frio é polar. ou porque eles assim o desejam. eles e seus isqueiros, suas bitucas, suas bombas caseiras.
um último ato desesperado. um pedido de socorro, talvez.
onde é que você se esconde? ouço falar nos abrigos aterrados de gente, na água daí que rareia. se meu corpo ainda se dói de pensar que tudo vai ser lentamente destruído e rapidamente abandonado (tenho sonhado com gente comendo gente), dói-me o mundo. que o mundo; você.
encosto devagarinho minha orelha no seu peito. minha orelha gelada. o dorso da minha mão, dentro da sua. você me ouve se estivesse um pouco mais perto. guardados dentro do meu apartamento feito de aço e cimento.
adiar o fim do mundo. o quanto aguentar. e o desmoronar, tanto faz, um jogo de amarelinha.
inferno, cadê você. um dois, um estampido. quatro cinco, apita a sirene. oito dez, meu interfone; céu-paraíso; você.
aguardo na janela, minha rua te espera, ansiosa de seus passos.