fevereiro 05, 2014

cartas bélgica #4

são paulo, 5 de fevereiro de 2014.

te vi outro dia na rua. lembro-me ainda de muita coisa. de nós, algumas pontas. do dia que adormercera no meu colo. ainda tem o sono pesado? você passava pela rua naquele seu andar entorpecido, atrasado para o último metrô. creio que sim. dormia e sonhava alto e não ouvia os estampidos, os tiros, o trator ininterrupto. acordava bravo porque me metia na mesma cama que você. sequer ouviu um naco das histórias que eu inventava e te contava em meio ao sono solto. respondia sempre monossilábico. afoito.
lembro-me de mim. mas os tempos me parecem outros. encontrei uma clareira, te disse? um dia quero te contar sobre ela. de como da terra da clareira vislumbrei um outro mundo. um dia, talvez, me conte dessa sua sobrevivência trôpega, escorregadia. nunca entendi como prefere apoiar-se aos escombros na promessa duma fortaleza. acho que nunca entenderei. 
peguei a mania de pisar descalço no asfalto quente, talvez você não entendesse. 
até um dia qualquer. dessa vez, não precisa responder.