fevereiro 05, 2015

uma lista

uma lista!
uma lista - é claro.
das minhas privações
da falta de propriedades
de prioridades
privadas ou sobre qualquer coisa
públicas também

uma lista seria grande o bastante
opressiva e assustadora
de olhos juntos e joelhos cerrados
- minhas gengivas inflamadas
e os dentes deles sangrando
a sua lista também seria
ainda mais opressiva e derrubadora
compararíamos as listas.

compararíamos e morreríamos
- enfim!
de comparação medíocre
eterna e desolada
infrutífera e descascada
bem portada num deserto
morreríamos enfim
talvez com algum alívio
porque qualquer um suspiro
estrangula os ossos miúdos
ter que viver todos os dias

sem chão nem revolta
uma mínima ode à vida
ou aos explorados
ou morte aos exploradores
morreríamos de cabeça quente
de saliva seca e silêncio sagaz

nossos tesouros perdidos e contas de banco esvaziadas
completamente - 
nenhum nome paira na eternidade
o universo é univoco
flutuamos sem destino nem espaço
pairando ora ou outra na órbita estrangeira
sem nem sequer se dar conta
ou perceber a indiferença

uma lista! uma lista das minhas privações
e dos meus arrependimentos
e da minha vergonha de não ser tão privada
e assim me manter trancafiada

uma lista dos meus dias:
meu café amargo e ruim, o pó barato,
o pão,
a cama,
a dor nas costas,
a tv desligada,
a internet sem fio,
a internet caindo,
a água,
a torneira,
o banho,
a cama,
a cama,
a cama,
o jogo estúpido
o vivo,
a transa,
a transa,
a cama,
a cama
a cama.

impossivelmente se escreve
não resta qualquer coragem
de pisar na rua de novo
não me resta nem vontade
a cama,
a cama
a cama.