junho 26, 2009

morfina.

a letargia é minha dança favorita. e de tanto ser dança, e movimentar meu corpo pelas vozes d'alma, é apenas doença. estou mergulhada neste mar de nada; meu corpo é mero instrumendo vazio e vadio. e os olhos parados, e o sorriso esmigalhado de quem não quer sorrir, e a dor fraca de quem não sofre. um mar de nada; só branco e só preto; uma cor difusa que não tem cor. uso a morfina, o dia-a-dia para me afastar do que é profundo. todas as ações corriqueiras, meus gestos previsíveis a mim mesma, minha personalidade que só se repete, mina todas as contradições e aflições de aqui de dentro. me sinto centrada e normalizada. isso me aflinge. a falta de aflições é minha principal aflição. uma alma quieta, que não tem vontade de se impor, e um corpo que só segue, nesta dança estagnada. sou sedada por minhas próprias vontades. se há o que aqui de dentro poderia eu me admirar com meu próprio céu e meu próprio inferno, tudo escapuliu. sobrou-se pedaços, pensamentos coerentes, que seguem a corrente. a corrente que é próspera, e que leva pra frente. ah não! e se tivesse alguém que se desesperasse por estar sendo levada pelos ventos do acaso e pelas correntes que bem-se-quer, e se tivesse alguém, seria eu. minha'lma sem contradições é minha maior contradição. fiz uma imagem falsa de mim mesma. o espelho está rachado, e eu apenas me sinto mergulhada aqui. fui sedada. nada me atinge, aqui fora existe uma parede, aqui fora existe esta parede que me prende. e diz-me ela, ingênua em sua própria existência, que é minha proteção. em que hora eu pedi proteção? em que hora quis eu morfina eterna injetada em minhas veias? já não posso me lembrar, pois a letargia me impede. me deixa aqui, vivendo o que se há para viver, sem mais desejar nada. a letargia é meu vício, minha amada, minha protetora. a letargia acabará por acabar comigo.