outubro 29, 2011

memo-amor

tenho sentido fome. sinto o teu cheiro debaixo das minhas unhas. comidas. ás vezes, vem-me seu cheiro numa ou outra amiga suja que conservo. é que gosto de. melhor não dizer.
fome, para sentir o vazio. é engraçado: depois do estômago roncar, ele pára. e por longo tempo, hitato, sente-se nada. nem fome, nem nada.
isso explica tudo: de certa maneira, mais nada sinto. faz tempo que não como, amor. não como amor. o estômago ronca, e eu espicho, repentinamente desesperada. gato ouve ronronar de rato debaixo da escada. caça. mas tudo é ilusão.
eu não sinto mais nada. nem fome, nem vontade de comer. nada. vontade de. atropelada. digam que é auto-censura, não sei. meus mecanismos de defesa estão além de mim. já não sei, porque não sinto. e pouco penso. não me esforço. não mesmo. sou mimada. por mim, em mim. mima-me.
mas vem-me teu cheiro. amora. ai! é que a nostalgia ainda me apela. sinto-a correr pelos poros: saudade. eis amor que não largo. saudade aperta-me os braços, as pernas. sinto-me paraplégica. tetra. quatro de ti.
saudade, eis amor que não largo. me move em larga escala. por ela, sigo assim. saudade. e o receio de sentir saudade, é o que me segura. saudade.
por você, ainda vivo, aqui. e te procuro. gosto de lembrar: lembro do prato de comida que me recuso a comer. debaixo das minhas unhas, você. logo aí, debaixo das minhas unhas. tão sujo. tão puro.
memo-amor. se amo, é de memória. amo a mim, infortunamente. sou desgraça. se me odeio de pouco em pouco, de largo caminho, acabo por amar só aquilo que construo. eu. egoísta, de um jeito trágico. quem dera fosse egoísta como os outros falam. sofro.
egocêntrica, porque o mundo esteve em mim. aqui. vontades de criadora. besteira. acabo por não viver, apenas lembro. e se não vivo, é mentira. pura estupidez. sofro e sei porquê. continuo. masoquismo. continuo.
memo-amor, meu amor, me perdoe. sou assim, toda eu. não há mais nada aqui, embora pareça. sou nojenta. continuo. mas não me deixe. eu choro. de solidão, juro que choro. é idiota; contraditório. mas continuo. não sei viver de outra maneira. continuo a barrar a felicidade. continuo a. não sei. se fosse possível viver sozinha. não é, que graça teria?
gosto dos olhos, do cheiro, do líquido dos olhos, do cheiro, do tato, dos ossos, sentido. sentir a fome, fisicamente. preciso sentir. em ti, massa. real. concreta. continuo. auto-destrutiva, destruirei um mundo (o meu). e quem se aproximar. se aproxime, por favor. sou inofensiva, me sinto sozinha. juro. comigo, por favor, me toque. no estômago que parou de roncar, há muito. faz cócegas aqui onde não sinto, eu deixo, vem.
de algum jeito, me consome. quero sentir-me consumida. quero levar de ti a memória dos olhos líquidos. me martirizar com a saudade infinita. quero a infinitude do memo-amor. eu sou assim. é simples. gozo, choro. continuo.