março 02, 2010

diário de bordo ou coisas que percebemos quando se passa muito tempo dentro de um ônibus sozinha

não sei bem se as pessoas me acham bonitinha, sim ou não, não, talvez. devem me achar esquisita, isso sim, sei que sim, e é um lugar de esquisitos estes que ando frequentando. é que não gosto de cumprimentar, não sei cair em formalidades, não gosto de dar oi a quem não falo com proximidade. pois estes ois são distâncias disfarçadas em popularidade desnecessária. ou este viés seja mesmo muito pessimista. são só maneiras de iniciar um relacionamento. esta aí coisa que não sei como faz: como estabelecer relações com as pessoas. mas sim, me relaciono, a todo tempo, acho amigos, mesmo que porção-única, mesmo que me distancie, mesmo que os ame logo de cara, mas não sei como fiz eles, eles me acham, a gente se descobre. e se derem chance, eu vou falar até nunca com quem quer que me sinta bem, falarei de qualquer coisa que você escolher: eu darei risada de quase todas as piadas. vou falar, eis coisa que gosto de fazer. vou dissertar sobre o mundo ou qualquer grunhido de emoção. mas talvez seja para disfarçar. disfarças os silêncios. eis coisa que não aguento: silêncios. sei que são saudáveis e necessários, que a quietude faz os olhos baixarem, e os pensamentos devenear, e tal cumplicidade se dará pelo ar, pelo instante, pelo olhar, tudo isso muito bonito... mas não agora. não com quem acabo de conhecer, acho silêncios constrangedores. acho que são ótimos em relações íntimas: aquelas que se pode silenciar e o outro não invadirá seu espaço - pois já pertence completamente ao seu espaço. mas naquelas relações-início, tento preencher todo tipo de silêncio, mas digo de cara, não sou boa nisso. e acabo por me rebaixar, pois frequentemente ouço comentários de outras pessoas: tal pessoas é tão animada, sempre tem o que falar, fulana tão interessante. e assim: pronto, além de não ser bonitinha, ter o rosto de certa forma montado de um jeito ou outro que pareça agradável à vista alheia, não sou interessante. não sou animada, engraçada. todos os requisitos para não ficar sozinha e presa com os próprios pensamentos. coisa mais terrível essa: você com você na multidão colorida. e não é multidão esta idiota ou desinteressante, é uma multidão de multiplicidades lindas, e eu tenho vontade de abraçar tudo isso, de me achegar de todas as pessoas, e ouvir o que a alma diz baixinho para os ossos, para os músculos, para os órgãos. quero explorar todos ao fundo, mas não será possível: sei que não. nem tudo é hamornia, mas no momento, a harmonia muito me agrada neste caos de pessoas.