dezembro 22, 2010

deus dá asas à minha cobra

escuta, me desculpa. me desculpa, mas eu sou assim, um pouco confusa. é que você me deu tempo de olhar pra janela, de pensar um pouco. eu não funciono assim, pensando. você tem que me pegar de surpresa, me dar bote feito cobra. deus dá asas à minha cobra. eu quero ele dê asas às cobras de vocês, porque assim eu posso ser pega desprevinida. se não for assim, eu sou um porre. eu olho, penso, reviro. em um segundo, eu já tenho todas as possibilidades. e as possibilidades me fazem querer morrer. o medo de tomar a decisão errada, sempre isso. eu acredito nisso - mas não é verdade? - nisso de que tudo tem uma consequência. você acredita que alguma coisa pode ser solta assim, pode ser tão desapegada das amarras, da vida, do mundo? se for pra ser tão desapegado, eu ando não querendo. eu até acho divertido - mas você sabe - não é nada além disso. sabe que eu vivo nesse mundo fechado, nesse círculo, as mesmas pessoas, sabe, é como se todos estivessem presos dentro de um quarto, e o quarto não é tão pequeno, e as janelas tão altas e fechadas. nesse quarto tudo pode, porque ninguém vê e ninguém julga. nem deus tem coragem de espreitar por debaixo das portas porque ele não poderia. o inferno tá lotado de gente já. e eu tenho me acostumado a estar neste quarto, a não ser julgada, a ser tão mas tão despregada, tão mas tão livre, que a liberdade é uma prisão. clichê, né? mas é, é sim. daqui a pouco, nada vale. não vale minha ou sua vontade, porque é tudo nosso. onde a gente queria chegar assim? eu não posso. eu voltei presse mundo, que é concreto que é grande que é assustador, meu deus, olha só o tamanho desse céu, olha essa profundidade - eu-não-sei-lidar-com-tudo-isso. desaprendi. e voltei a ser assim, meio pequena. mente fechada - você diz. minha mente é aberta, acho eu, eu tão racional, eu tão fria, eu tão libertária, eu tão aaaaaarr... não. eu tenho um coração fechado. entende? e da mente a gente foge, molda, faz o que quiser. do coração, é quase impossível. emoção a gente não controla. não controla tesão, não controla coração acelerado, não controla vontade. e meu coração é conservador, sim. não sei, mas é. eu tentei disciplinar ele, mas não dá. e depois, nesse mundo, eu tenho que me proteger. antes a minha liberdade me prendia, e eu já tava de saco cheio. agora que eu tenho todo esse mundo me encarando de frente, esse mundo que ninguém perdoa ninguém, e eu tenho que tomar certas medidas, se não eu não ia sobreviver. sei disso, porque já fui desse mundo grande. fui muito mais dele do que dessa liberdade às avessas que conquistei (ou que só abocanhei). e pra me proteger eu me enfiei nessa prisão, nessa minha própria prisão, dos meus sentimentos, das minhas vontades, dos meus blablablas, dessa confusão que não faz sentido. essa prisão, pelo menos é minha. e é egoísta, porque não tem lugar pra mais ninguém dentro dela. ninguém que meu coração não queira. é tão assustador assim? eu sempre fui meio assim, meio arredia, meio cheia de coisa. é, cheia de coisa. de tudo isso que eu te falei, de todas essas concepções, eu pensei em tudo isso e um pouco mais antes, e aí já não dava mais. e se eu vou me foder, bem... acredito que sim. mas a gente ta aí pra isso.