novembro 05, 2012

louva corpos

eram corpos louvados, benzuntados por deus, faziam sexo de graça sem porquê, a céu aberto e céu dourado que era o céu daquelas tardes, tardes infernais de primaveras ilícitas, que cantavam entre lá e cá, uma ou duas maritacas mal extintas. e quando o céu descia violáceo, que era essa a cor das tardes que caíam, e os meus óculos de sol retrospectivos viam, a tudo meio amarronzado, como se dois corpos se forcando pudessem ser dois corpos se putrificando, se deles o suor etéreo e de sumo mágico, que é o que chamam os deuses, que é pelo que as ninfas louvam, para mim tinha cheiro de ocre e de mofo, era verde, então, verde meu vale, verde meu vale fundo escuro de louro: era verde meu vale e ninguém quis. me afundei na minha própria selva de pelos crespos e procurei com os dedos o tesouro perdido, o tesouro descontente que desencontraram os membros deles, e eu, nada achei, tamanha era a procura e a sede, eu levantei, sem antes não olhar projetada minha imagem, minha imagem patética, que nua como um pãozinho desforme, contei as gordurinhas das minhas costas, de um jeito solitário como se no fundo a música que eu ouvisse não fosse os gemidos descompassados dos outros que não dormiam. e levantei indecisa andando pelos corredores, que pareciam escorregadios como feitos de sêmen, e passei a lambê-los com certa insistência, tentando sentir o gosto que você fazia questão de dizer que era delicioso, tentando ser uva também nesse picolé, mas de recalque a tinta barata da parede se descascou e do triste vão que se abria eu via: por detrás das portas eles ainda fornicavam e a cama era branca e alaranjada, e eu, branca envernizada, corri a buscar águas, fumar cigarros, comer troços. voltei empanturrada de nada e os dois corpos empanturrados de corpos, cheios inteiros até os pescoços de grossuras e órgãos e dessas coisas absolutas, e eu que tão só relativa, me deitei que ainda em mim sentia leve o ressoar da deusa marinha, que na minha vagina soprava o ar salgado que fazia-me abrir as ventanas e a boca em formato de o e os olhinhos revirados faziam estralar e eu então deitei-me a fim de que a deusa virasse monstra e o ar tormenta e um pouco de dor, também, que sem dor não existe recompensa. mas de tanto não fui notada, o corpo era também peça escorraçada, já não sei o que contava, se o relato cíclico se tornava, era o que me acontecia, ele a acariciava e eu em loucura branca me comportava mas era azul, multicolorido, múltiplo demais para minha retina duas cores, bastonetes drogados de ópio, de tristeza preta-e-branca. e eu que não sou ninfa e não sou bonita, e eu que olhei atenta pros meus peitinhos e eles olhavam estrábicos pro teto e você com seu corpo lúgubre encostou sem querer e os esmagou no lençol que fez ranhuras dos meus mamilos amassados. os meus mami amassadi. nhos. eu quis ser chorosa e ser gordinha dizer, olhai, faço com carinho o meu dengo é de, é de, é devagarzinho. e eu que não mais quis o meu corpo que é torto e farto e eu que olhei para ela, que linda, admirei-me, parecia estrela, novela, atriz, parecia brigitte bardot, parecia camila pitanga do pará, parecia mulher de curvas, brasileira de fogo, e eu que quando escrevo uma coceira me dá: você é a minha musa, menininha, mas dói mais ele. que não olha, não troça, não rola, não capota. e do escuro íntimo do quarto molhado do escuro escroto que estava metida até o pescoço em divagações nada sadias, coisas de suicida entristecido coisa e tal, que chatice, do escuro que era propício dos dedos ficarem se desmanchando nas genitálias alheias mas nunca a minha, do escuro que era propício jamais não olhar para meu corpo, que naquele antro parecia, corpo de um diabo implantado, corpo jamais quero ser visto, abri com os pés de sardinha em lata a janela que era minha, e a luz que cegou os olhos vastos da gente iluminada, que já o estava por dentro, e me deu alguma água, alguma trela, trégua, retaguarda, apito de guerra, de recolhida. e reclamaram as almas sadias e os ventos expansivos e a tarde tão bonita que se esvaía e as maritacas tropicais que apitavam e a música sambabaca que batucavam e os beijos de amor com vapores de paixão e a beleza do corpo que se fez trepar e trepado e do coração esquentado e a felicidade esmoreceu. e eu, que pequena e escurinha de pé sujo e alma encardida, e eu, não fiquei alegre, tampouco triste, mas respirei, dum ar que não era só sexo e retidão: era também ar do mundo que é cor de tijolo que é concreto que é mal descascado e que não é beleza e que não é saciado o mundo que anda sempre batendo punheta porque não tem quem lhe agrade lhe dê beijinho lamber o saco que sempre é escurraçado que sozinho vive e vê pornô de quinta o mundo que é subjugado porque é mesmo rejeitado o mundo todo que é assim - só-vocês-são-felizes. recolhi a língua sapeca de criança e saí correndo dos altos do meu um metro de altura, os cabelos batendo na bunda, a calcinha mal caída e os mamilos redondos no peito liso, corri pra brincar de mangueira se-não-me-quer-mal-me-quer, e uma ducha de água fria salva tudo, mulher feia e mulher bonita.